Analisando o relatório “Futuro das Profissões” (Fórum Econômico Mundial)
Confesso que poucas vezes vi um relatório ser tão compartilhado como o “Futuro das Profissões”, do Fórum Econômico Mundial, e isso me deixou muito contente, pois acredito que a dimensão “Talentos” precisa ser agregada a qualquer exercício estratégico sério.
No entanto, na maioria dos compartilhamentos, enfatizou muito 5 tendências que estão direcionando a transformação dos negócios e do mercado de trabalho: Mudanças Tecnológicas, Incerteza Econômica, Fragmentação Geoeconômica, Transição Verde e a Transição Demográfica. São pontos muito relevantes e têm impactos diferentes em cada negócio, portanto necessitam de uma reflexão específica para a sua empresa.
O outro foco foi o “quantitativo”, isso é o da criação de empregos ser maior que a destruição, até 2030. Isso é ótima notícia, porém novamente merece uma análise mais detalhada, para poder antecipar os impactos em sua carreira, sua empresa ou o seu setor. Há 2 quadros interessantíssimos, onde se mostram as carreiras em maior ascensão e declínio, sendo tudo aquilo ligado às 5 tendências acima os mais promissores: Big Data/AI, Engenheiros de Tecnologia em diversas áreas, Segurança Cibernética, Engenheiros Ambientais, mas também entregadores de pequenos caminhões (“last mile”).
Já entre os com maior previsão de queda vemos 3 grandes blocos: os “clerks” (ou atendentes), profissionais de nível básico em contabilidade ou advocacia, mas também desenhadores gráficos. Aqui vemos o impacto direto da Inteligência Artificial Generativa, ou Gen AI, sobre o mercado de trabalho, automatizando tarefas feitas principalmente por profissionais em início de carreira.
Há, porém, um terceiro elemento, menos explorado, que é justamente a identificação das habilidades que serão mais necessárias em 2030, além de estratégias que podem ser adotadas, em base aos 2 elementos iniciais (Macrotendências e Empregos Promissores/Em queda).
Esse é um processo em 3 fases:
I. A identificação de habilidades do futuro
II. A comparação com o que você tem dentro de casa
III. O desenvolvimento das estratégias de aquisição
A identificação de habilidades do futuro
O próprio relatório identifica as principais habilidades em algumas indústrias, mas esse é um exercício que precisa ser realizado em cada empresa, ainda que traga o marco teórico do Fórum Econômico Mundial.
Digo isso porque as habilidades necessárias tem relação direta com a estratégia da sua empresa no futuro, ou seja, quem você quer ser e como irá se diferenciar dos concorrentes.
Há uma frase que adoro e mais ou menos diz que “o futuro é um local para onde estou indo rápido, assim posso cumprimentar meus clientes quando chegarem lá”. Essa é a base do exercício inicial: o que terá valor para meus clientes no futuro, e como consigo produzir esse valor de maneira mais eficiente?
Para realizar esse exercício, acredito em 3 fontes principais:
1) Clientes: devem ser a grande bússola em qualquer orientação a futuro, porém é importante falar com os clientes corretos, aqueles que realmente pensam “para frente”. Sessões de “Voz do Cliente” bem estruturadas, ajudam a registrar essa visão e disseminar internamente. Os “não clientes” são igualmente importantes e essas sessões trazem insights riquíssimos, para que você se prepare para atender os “não clientes” no futuro;
2) Benchmarking: se você trabalha em uma empresa menor, talvez valha conhecer o que as empresas grandes estão fazendo… e o contrário é ainda mais verdadeiro. Se sua empresa é brasileira, vale pesquisar com apoio da Gen AI sobre empresas inovadoras em outras países. Finalmente, um pouco mais avançado é olhar para setores com problemas similares ou seus, ou futuros convergentes, tentando entender as barreiras e soluções;
3) Consultorias e formadores de opinião: há muito material disponível hoje, bastando uma vez mais a disciplina para organizá-lo e traduzi-lo para as suas necessidades. Novamente, a Gen AI ajuda muito nessas tarefas, em especial para sintetizá-las e encontrar padrões, mas você deve ir atrás de boas fontes.
Após entender “o que terá valor no futuro”, vem a parte mais complexa: como produzirei valor no futuro, de maneira mais eficiente? E aqui o trabalho é ainda mais intenso, já que você precisa revisar todos os processos atuais e pensá-los “daqui a 5 anos”. Não apenas o como faço hoje e como farei, mas também o que eu deveria fazer e o que não.
As fontes aqui são:
1) Seus funcionários: é razoavelmente fácil que alguém te diga o que precisa para fazer o seu trabalho melhor, mas é muito difícil alguém te dizer como fazê-lo diferente, em especial se a resposta for “sem mim” ou “com tecnologia”. Para isso, minha recomendação é que você acesse a 2ª fonte antes, para que chegue com ideias;
2) Fornecedores: eles também deveriam fazer o exercício sobre “ao que meus clientes irão dar valor no futuro”, portanto deveriam poder proporcionais ideias para seus principais processos de trabalho. Seu papel, do ponto de vista ético, é utilizá-los durante a exploração, mas sem transferir conhecimento com concorrentes. Além disso, ao decidir pela implementação de novas soluções, os melhores fornecedores deveriam ser priorizados ou, pelo menos, convidados a participar de seus projetos;
3) Consultorias e Universidades: no caso dos consultores, eles estão enxergando o mercado todo o tempo, mas também estudando esses assuntos, para continuarem relevantes. Além disso, conhecer os problemas para implementar novas soluções e processos, já que os enfrentam em outros Clientes. Já as Universidades trazem pensamentos de ponta, com grande conhecimento científico, que nem sempre tem implementação prática, mas que geram excelentes ideias de futuro.
Pronto: você analisou o que terá valor e como irá produzi-lo no futuro. Com isso, tenho certeza que pode preparar o “Mapa de Habilidades necessários para 2030” e terminar a 1ª fase do plano.
A comparação com o que você tem dentro de casa
Esse exercício parece quase impossível, mas não é, ainda que demande trabalho e organização. Uma forma, que julgo a melhor, é gerar um sistema simples de registro de habilidades por parte dos seus trabalhadores. Esse é um conhecimento valioso e que deveria pautar todas as iniciativas futuras de desenvolvimento, inclusive o curto prazo. Onde as pessoas já trabalharam, há quantos anos estão no seu setor, que áreas já percorreram nas empresas, que tecnologias dominam, tudo conta para identificação das habilidades atuais.
A outra opção, dependendo do nível dos profissionais, e da indústria e do setor onde você atua, é ir atrás dos profissionais da sua empresa que estão no LinkedIn e gerar uma amostra dessas habilidades.
Após ter isso em mãos, a Gen AI também pode ser utilizada para um mapeamento das habilidades e a comparação com as necessárias, porém há outras soluções de RH prontas para isso, e que trazem insights interessantes.
O mesmo para as tecnologias aplicadas aos seus processos: o que tenho, como foi desenvolvida, quem conhece dela, qual o custo de atualização, enfim, perguntas exploratórias e específicas, para definir seus maiores bloqueios para o futuro.
O desenvolvimento das estratégias de aquisição
Há algumas linhas de pensamento para fechar as lacunas entre as habilidades do futuro e as atuais. Daquilo que pude conhecer e viver até o momento, acredito em três abordagens principais:
- Upskilling e Reskilling Interno: Investir na capacitação da força de trabalho atual para novas demandas pode ser mais rápido e econômico do que contratar novos profissionais. No entanto, não se engane… custa caro desenvolver ou contratar os treinamentos… e custa “tempo” treinar pessoas, além da necessidade de apoio dos gestores para essa tarefa, e da motivação dos próprios trabalhadores.
- Aquisição de Talentos Externos: Contratar profissionais já especializados é uma estratégia para resolver demandas específicas e trazer novas perspectivas, no entanto deve ser aplicada de maneira cirúrgica, sob risco de desmotivação do público interno que deseja participar do futuro. No entanto, ao iniciar muito antes esse planejamento, você pode aproveitar a rotação normal de pessoas da sua empresa, para repor os talentos com as habilidades que irá precisar no futuro. Essa estratégia gera menos turbulência e vai criando a cultura desejada aos poucos
- Parcerias Estratégicas: Empresas estão cada vez mais formando alianças com freelancers, startups e outras organizações. Nesse momento, a integração entre talento humano e tecnologia deve ser explorada para acelerar os resultados da transformação desejada.
Tecnologia e Talento: A Fronteira Humano-Máquina
Acredito válido destacar, uma vez que há muita discussão sobre pessoas, processos e tecnologia neste documento, alguns pontos de vista e observações sobre essa interação.
Automação e Colaboração O WEF projeta que, até 2030, 34% das tarefas serão realizadas por uma combinação de humanos e máquinas. A Gen AI é citada como uma das ferramentas mais transformadoras, especialmente para tarefas criativas e analíticas.
Impacto da Gen AI nas Gerações Mustafa Suleyman, da DeepMind, sugere que a IA não apenas automatizará tarefas, mas também criará novas oportunidades em áreas estratégicas, reduzindo a pressão sobre líderes seniores e permitindo maior integração de jovens talentos.
No estudo Generative AI and Labour Productivity, Gambacorta et al. relatam que ferramentas como a Gen AI aumentaram em 55% a produtividade de programadores juniores ao automatizar tarefas rotineiras e liberar tempo para atividades mais complexas. No entanto, a adesão foi menor entre profissionais seniores devido ao menor engajamento com a tecnologia.
Automação como parceira: Jesuthasan e Boudreau afirmam que “o novo sistema operacional de trabalho revela soluções mais otimizadas e diferenciadas” ao integrar automação com o talento humano, aumentando a produtividade e reduzindo erros operacionais.
Ferramentas como GPT e CodeFuse têm demonstrado potencial para aumentar a produtividade, especialmente em tarefas rotineiras ou de baixa complexidade. Inclusive programadores juniores observaram ganhos de 55% na produtividade com o uso dessas tecnologias.
Ao mesmo tempo, Automação e IA permitem que líderes seniores deleguem tarefas repetitivas, concentrando-se em decisões estratégicas. Isso abre espaço para que recursos sejam redirecionados ao desenvolvimento de jovens profissionais
Em resumo: você precisa ter um plano estratégico de talentos
- Identifique necessidades futuras: Com base em tendências do mercado e previsões tecnológicas, projete os próximos desafios.
- Mapeie competências internas: Avalie o que sua equipe atual pode oferecer e quais lacunas precisam ser preenchidas.
- Escolha abordagens eficazes: Adote uma combinação de upskilling, aquisição e parcerias.
- Incorpore tecnologia: Use ferramentas como a Gen AI para suportar decisões estratégicas e operacionais.
- Promova o equilíbrio intergeracional: Invista na mentoria e no aprendizado contínuo entre gerações.
Preparados para 2030?
O futuro do trabalho exige que as organizações sejam proativas em sua estratégia de talentos. Empresas que combinam previsão de habilidades, integração tecnológica e uma abordagem inclusiva estão mais bem posicionadas para prosperar. A pergunta que fica é: sua organização está pronta para liderar essa revolução?