“Transformação Digital hoje é pouco. Planeje a Transformação Cognitiva da sua empresa”

Digitalização, Transformação Digital ou Cognitiva: Em qual nível de letramento sua empresa está?

Digitalização, Transformação Digital ou Cognitiva: Em qual nível de letramento sua empresa está?

No ínico de 1.999, eu e minha esposa planejamos uma viagem para a França. De mochilão nas contas e guia “Berlitz” de Francês na mão, queríamos conhecer o país da “Liberté, Egalité e Fraternité”. No entanto, durante a preparação para a viagem, decidi “aprender francês, para me virar por lá”, porque não queria depender do guia de bolso para tudo.

Fiz as minhas 12 aulas de conversação, com foco em situações de viagem e saí confiante do Brasil. Mas, logo ao pousar no Charles De Gaulle, percebi que tinha esquecido de fazer a aula “trocando dólares por euros”… foi frustrante a minha primeira experiência como “falante de Francês”, a qual deixou claro que eu não “falava Francês”, mas apenas sabia usar algumas palavras e expressões, que poderiam me ajudar em situações de hotéis e restaurantes.

Mas… por que “fluência em Francês” é relevante para um texto sobre Transformação Digital? Porque a fluência no idioma digital deveria ser o objetivo de qualquer empresa, e isso demanda passos muito bem estruturados.


O desenvolvimento da fluência digital

Para transformar isso em algo tangível para o leitor, ou seja, para desenhar um paralelo dos 3 passos acima (1. “consulta ao guia de bolso”, 2. “conhecimento básico para ser mais eficiente”, 3. “letramento em francês”), fui atrás de modelos analíticos para o desenho de estratégias de Transformação Digital.

Encontrei a “Pirâmide de Lang”, que foi apresentada por Volker Lang em seu livro “Digital Fluency”, de 2021, no capítulo “Digitalização e Transformação Digital”. Esse modelo hierárquico apresenta uma progressão, desde elementos mais básicos da digitalização, até a verdadeira transformação digital.


As palavras usadas por Lang para definir os 3 níveis hierárquicos são Digitization, Digitalization e Digital Transformation. Em Português, não fazemos uma diferenciação clara entre as 2 primeiras, portanto em uma tradução livre preferi adotar “Digitalização da Informação”, “Digitalização de Processos” e “Transformação Digital”.

1. Digitalização da informação (agregar informação): O processo de converter informações analógicas em formatos digitais. Imagine que um escritório de advocacia escaneia todos os processos, para maior proteção, durabilidade, redução de espaço físico e outros benefícios práticos.

Há implicações relevantes já para esse nível, como a necessidade do aumento da segurança cibernética, decisão de aluguel ou compra de espaço digital, organização do material em uma base de dados, além das atividades inerentes da digitalização do input (qualidade, investimento de tempo e dinheiro).

Em empresas com passado analógico, esse é um passo fundamental e obrigatório para se atingir os níveis seguintes, mas no artigo de 2017, “The case for digital reinvention”, profissionais da McKinsey já apontavam, em base a estudos com seus clientes, que embora a digitalização forneça a infraestrutura para avanços digitais, ela não impulsiona, por si só, mudanças organizacionais ou resultados estratégicos.

Na verdade, diversos outros autores observam que mesmo para implementar ações neste nível, é importante contar com uma estratégia macro, idealmente para o 3º nível, mas pelo menos para o 2º, pois as decisões mais básicas de infraestrutura podem mudar sensivelmente de acordo à ambição da empresa em relação à sua digitalização.

2. Digitalização de Processos (analisar informação): O uso de tecnologias digitais para aprimorar processos existentes, tornando-os mais eficientes, sob a dinâmica de redução de recursos para se atingir (ou melhorar) o output (resultado do processo) atual. Esses recursos a serem reduzidos podem variar de acordo à indústria, como por exemplo maior velocidade e menor uso de recursos humanos em serviços, a menor utilização ou perda de recursos naturais em fábricas, ou ainda a geração de uma menor pegada de carbono em serviços logísticos ou indústria extrativista.

Novamente usando o exemplo do escritório de advocacia, podemos imaginar que os processos digitalizados sejam aproveitados para eficiência na preparação de petições. Quais tiveram a aprovação mais rápida dos juízes? O que elas têm em comum? Ou ainda, o que cada juiz prefere ver nas petições?

Em um texto de 2019, Optimizing Digitalization Efforts, consultores do Gartner reforçaram que a digitalização de processos é crucial para otimizar as operações, mas deve estar alinhada claramente aos objetivos organizacionais para gerar valor real. Em resumo, analiso a informação e tomo decisões de negócio, aceleradas por tecnologia

No caso do escritório acima, imagine que esteja situado em um mercado muito competitivo e que ainda não tenha força de marca suficiente para atrair os melhores estagiários jurídicos: como esses estagiários podem preparar petições que sejam mais eficazes, levando em conta as suas limitações, para atrair clientes que, no futuro, sejam atendidos por outras áreas mais consultivas do escritório?

3. Transformação Digital (monetização da informação): Uma reformulação abrangente de modelos de negócios e estratégias por meio de tecnologias digitais.

A MIT Sloan Management Review, no texto The Essential Guide to Digital Transformation, de 2020, relembra que a verdadeira transformação digital vai além da implementação de tecnologias, abrangendo reestruturações estratégicas e mudanças culturais em toda a organização. Consultores da BCG igualmente enfatizam que a transformação digital exige uma estratégia holística, integrando novas tecnologias para impulsionar a inovação e criar uma vantagem competitiva sustentável.

Novamente pensando no escritório de advocacia, imagina que ao desenvolver essas consultas para petições otimizadas, seja desenvolvido um mecanismo de consulta que pode ser utilizado por escritórios menores ou advogados independentes, através de um modelo de assinatura. Algo desenvolvido como tecnologia proprietária, para melhoria de processos, se torna uma fonte adicional de receita. Esse é, aliás, a grande genialidade do modelo de negócio da Amazon, que ao buscar a otimização do uso dos seus data centers, criou a sua divisão de cloud computing.

Como você deve ter notado, cada nível da pirâmide implica um aumento da complexidade e do impacto estratégico na empresa, o que se traduz em investimentos cada vez maiores. Para garantir a efetividade dos investimentos, além da clara necessidade de alinhamento dos objetivos de médio e longo prazo, está a qualidade da equipe de líderes para a tomada dessas decisões.

Algumas empresas decidem contratar consultores e entregam a eles a tarefa, de integrar a revisão estratégica ao investimento tecnológico. Outras contratam melhores profissionais de Tecnologia e Dados, além de montar Conselhos de Administração ou Consultivos, com profissionais experientes em Transformação Digital.

Há um terceiro grupo, no entando, que decide aumentar o letramento digital da equipe de liderança e, em alguns casos raros, de toda a organização, para atingir o que defino como “mentalidade digital”.

Nesse momento, a Transformação Digital atinge outro estágio, o de Transformação Cognitiva, no qual os profissionais passam a pensar digitalmente. Como otimizo processos, usando dados? Que oportunidades tenho para distribuir e criar produtos, em base a tecnologia?

Fazendo um paralelo com o início do texto, neste momento podemos dizer que a empresa se tornou finalmente fluente em Francês, podendo viajar por seu mercado com muito mais confiança e eficiência.

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